Capítulo 22

Conspiracy



Música do capítulo: Conspiracy

Sexta-feira, 12 de Fevereiro
Taylor

Estava eu andando em direção à cantina com as meninas da minha turma, já que tanto Hayley, Jeremy e Zac estavam terminando algum teste, quando Lisa nos chamou a atenção para algo: um garoto da turma de Zac que, sendo sincero, passava bem despercebido num canto mais escondido do corredor. Ele estava claramente zangado, talvez com ele mesmo, e falava sozinho.

– Vou lá falar com ele.

– Eu vou também – me ofereci. Não ia deixar Lisa ir sozinha falar com um rapaz que parecia agressivo.

– Então nós também vamos.

– Não, vai ser gente demais. Fiquem aqui observando, mas discretamente, ok?

– Sério, Lisa, você vai virar psicóloga – brincou Jane, nos deixando com um sorriso nos lábios que foi morrendo à medida que encarávamos a tarefa à nossa frente. Aproximamo-nos lentamente. O garoto nos notou e levantou os olhos assustados para nós.

– Sim, o que vocês querem? – a voz dele cobria-se de um tom agressivo e me senti feliz por ter vindo com Lisa. Mesmo assim, foi ela quem tomou a palavra.

– Hmm… Nós te vimos dali e achamos que talvez precisasse de algo. Você é da turma de Zac, não é?

– Não preciso de nada, obrigado – ele nos cortou, seco, e se encaminhou para o corredor, passando por nós. Porém, quando nos voltamos automaticamente para observá-lo a se afastar, preocupados, ele já tinha parado e encarava outra pessoa – alguém que nem em mil anos eu esperava que ele fitasse com tal intensidade: Josh. Olhei para Lisa, vendo na sua face o reflexo da minha própria expressão confusa.

– Você sabe – o garoto disse para Josh. Ambos se mostravam bastante sérios e o garoto que, até agora reagia agressivamente, parecia… assustado.

Please speak softly

(Por favor fale baixo)
For they will hear us

(Porque eles nos escutarão)
And they'll find out

(E descobrirão)
Why we don't trust them

(Porque não confiamos neles)

– Sei. Mas não se preocupe, não me vim vingar. Você já terá seu castigo. Só quero saber quem organizou isso tudo – Josh parecia zangado, mas, estranhamente, não com o garoto. Tentei assimilar o que via se desenrolar diante de meus olhos, mas minha mente não achava qualquer resposta para aquilo.

Speak up, dear

(Fale alto, querido)
'Cause I cannot hear you

(Porque não te consigo escutar)
I need to know

(Eu preciso saber)
Why we don't trust them

(Porque não confiamos neles)

– Precisa mesmo que eu te responda a isso, Josh? Você já sabe quem foi, senão não estaria perguntando – um espasmo de dor pareceu percorrer Josh, fazendo-o fechar o maxilar com força, numa tentativa de se controlar. Ele fitou seus pés durante alguns segundos, até que outra ideia lhe ocorreu.

– Porque você fez isso?

O rapaz riu sem humor.

– Eu também tenho sonhos, sabe? Eles prometeram que, com você do nosso lado, não teria como correr mal. E eu… eu me deixei manipular. Me desculpe – ele deixou cair o olhar, realmente envergonhado e arrependido. Até nós, não sabendo do que eles falavam, pudemos ver isso. Josh observou a reação do rapaz com... pena? Sim, parecia isso.

– Não se preocupe, eu sei o que é ser manipulado por eles – Josh falou com uma risada seca. – Olhe, se precisar de alguma coisa, me diz, tá bom?

O rapaz fitou Josh claramente surpreendido, talvez achando que não merecia essa oferta. Porquê? Sem falar mais nada, ele assentiu, ainda meio chocado. Josh estendeu a mão para ele, o que o fez abrir mais os olhos, para logo depois abrir um pequeno sorriso. Apertando as mãos, eles se olharam, cada qual com seu sorriso. E foi assim que, bem mais aliviado, o garoto o ultrapassou como tinha feito conosco. Josh, porém, ao invés de se voltar para o observar se afastando como nós tínhamos feito, ficou fitando o vazio à sua frente. Isso, claro, até sentir uma presença estranha num canto que ele não tinha sondado.

E foi assim que ele se deu conta de mim e Lisa.


Explain to me

(Me explique)
This conspiracy against me

(Essa conspiração contra mim)
And tell me how

(E me diga como)
I've lost my power

(Perdi meu poder)


Seus olhos se arregalaram num primeiro momento, para depois dar lugar a uma expressão muito pesada, que pareceu sugar anos da face jovem de Josh. Era um misto de dor, desalento e um ressentimento que eu sabia que se dirigia a mim. Tinha como não saber, quando ele me fitava diretamente, ignorando até mesmo Lisa? E mesmo não entendendo nada do que se tinha passado, me senti culpado. Esse olhar foi o mais sincero que eu vi de Josh faz muito tempo, e ele dizia claramente que o teto estava desabando em cima dele. Em cima do meu amigo.

Mas antes que eu pudesse processar fosse o que fosse, Josh desprendeu seu olhar do meu e deu meia volta, negando com a cabeça. Talvez para se distrair de um algum pensamento. Talvez para se esquecer de mim. Como saber? Só lhe perguntando, mas eu não conseguia achar minha voz. Minha mente corria a velocidades estonteantes, mas meu corpo não respondia. Fiquei fitando o vazio, esperando alguma resposta.


Where can I turn?

(Onde posso virar?)
'Cause I need something more

(Porque preciso de algo mais)
Surrounded by uncertainty

(Rodeado por incerteza)
I'm so unsure

(Estou tão incerto)


A palavra surgiu, clara e inesperada, na minha mente: “graffiti”. De alguma forma, eu sabia que tinha algo que ver com aquele maldito graffiti, mas não entendi completamente. Continuo sem conseguir descodificar toda a conversa entre ele e o garoto, mas aquele olhar… acabei por perceber.

O que não adianta em nada. Ele continua sendo a mesma pessoa que nos causou toda essa dor. Que fez com que nosso primeiro álbum fosse sobre uma queda, não uma ascensão. E em cima de tudo isso, ele não se mostrou arrependido. Vez alguma. Nem um pouco!

Mas sendo assim… porque eu não consigo esquecer aquele olhar?

Tell me why

(Me diga porque)
I feel so alone

(Me sinto tão sozinho)
'Cause I need to know

(Porque necessito de saber)
To whom do I own

(A quem devo)

Explain to me
(Me explique)
This conspiracy against me

(Essa conspiração contra mim)
And tell me how

(E me diga como)
I've lost my power

(Perdi meu poder)


Algumas horas antes…

POV Josh

Esfreguei as palmas das mãos nas calças, tentando limpar o suor de novo. Não que fosse funcionar. Olhei para o relógio. Só tinham passado 3 minutos desde que ali me sentara, mas tinham sido os 3 minutos mais longos da minha vida – e isso vindo de alguém que já tocou para 200 pessoas. Devo ter batido algum tipo de recorde por ver tantas vezes as horas em tão pouco tempo. Mas a verdade é que não me pude queixar: uns demorados segundos depois, uma senhora saiu do escritório falando que eu podia finalmente entrar.

Assim fiz, respirando rápida e compassadamente de modo a acertar o ritmo de meus pulmões. Mas com meu coração martelando tão loucamente, duvidei de que o exercício de respiração surtisse efeito. Parei à porta, respirando fundo uma vez e me atirei de cabeça.

– Ah, Senhor Farro! Sente-se, por favor – falou, sentado atrás da secretária, o homem calvo de 50 anos. Suponho que gerir toda uma escola não seja propriamente fácil.

– Bom dia, Senhor Diretor.

– Como você está?

Eu devo ter ganho coragem do nada, porque lhe respondi com outra pergunta.

– Você quer que eu seja sincero ou que seja diplomático?

Ele me olhou de modo surpreendido, mas não zangado. Pelo menos isso não seria outro ponto contra mim. Se bem que, se era para eu ser expulso, seria de qualquer jeito.

– Sincero, claro.

– Nada bem. Perdi meus amigos por causa de tudo isso. E meus pais não andam propriamente felicíssimos comigo, sabe? – ele me olhou fortemente, ainda sem parecer aborrecido. Seu olhar passava preocupação. Estranho.

– Lamento escutar isso, Josh. Você sabe que a intenção não foi nunca mexer com sua vida. Nós queríamos apenas saber o que realmente aconteceu – assenti, de súbito sem vontade de falar. Na verdade, eu queria era chorar e implorar para que ele me desse sua decisão de uma vez por todas. Mas ele parecia ter mais coisas a dizer, de modo que segurei o nó na garganta o melhor que pude. – E acabamos por descobrir, na verdade. Descobrimos isso.

Ele tirou duas fotos do meio das montanhas de papéis aparentemente desorganizadas que enchiam o tampo da secretária e as pousou à minha frente, voltadas para mim. Elas mostravam um aluno que eu não reconheci entrando e saindo da escola, respectivamente.

– Sabe, Josh, nós não temos câmaras de segurança em toda a escola porque o Estado parece ter muitas outras prioridades que não são as escolas públicas – ele falou em tom quase de gozo. Suponho que gerir uma escola pública nos Estados Unidos seja pior ainda que o normal. – Mas temos sim duas câmaras na entrada que me saíram do bolso. Lamento que tenha demorado tanto, mas finalmente conseguimos provas que possivelmente provem sua inocência.

– Como assim? – achei incrível ter conseguido achar minha voz numa garganta que parecia desértica, mas acho que a curiosidade falou mais alto.

– Olhe para a data e hora – ele apontou para os pequenos números impressos no canto inferior direito das imagens. Ambas estavam datadas de 22 de Janeiro. A primeira – do garoto entrando – marcava as 9h55, enquanto a segunda tinha sido tirada uns meros dois minutos depois. – Onde estava você a essas horas, Josh?

– Às 9h55 eu já tinha chegado à enfermaria – falei devagar, entendendo o que isso significava. Olhei de novo para o rosto do garoto, decidido a odiá-lo.

– Exato, o registro da enfermaria bate certo com isso. Você deu entrada às 9h52 e só saiu depois das 10h. O que quer dizer que não houve qualquer tipo de chance de contato entre você e esse aluno.

– Mas essa é a única prova que vocês têm para suspeitar dele – falei, desanimando com essa percepção. Isso ainda não provava que tivesse sido ele a fazer aquele graffiti e não eu.

– Significa tanto quanto as provas que temos de você. Esse aluno deveria estar numa visita de estudo nesse dia, mas faltou, justificando que estava doente. Então o que está ele fazendo entrando na escola por apenas dois minutos? Apenas isso é motivo para começarmos a investigar, entende?

Assenti, sem conseguir falar de novo. Será que isso significava que eu estava… livre?

– Me diga apenas mais essa vez, Josh. Você realmente não teve nada que ver com o graffiti?

As lágrimas subiram a meus olhos de novo. Respirei fundo antes de responder, tentando controlá-las, e levantei a cara para fitar o homem diante de mim diretamente nos olhos. A única coisa que eu tinha do meu lado era minha consciência, e ela não podia falar mais claramente nesse momento.

– Você continua querendo a sinceridade, certo Senhor Diretor? – ele deu um minúsculo sorriso e assentiu. – Eu tive sim que ver com outro graffiti, mas não com esse aqui. Não toquei numa única parede dessa escola.

O diretor continuou me olhando com seu pequeno sorriso mais alguns segundos, talvez tentando determinar se eu mentia ou não. Eu me limitei a sustentar seu olhar. Não tinha nada de que me envergonhar, não mais. Era essa a verdade.

– Muito bem, Senhor Farro. Eu acredito em você.

Suspirei com o maior alívio que eu já alguma vez tinha sentido em toda a minha vida. A única vez que se podia comparar foi quando meu pai conseguiu tirar um Zac de oito anos do telhado. Ele tinha visto Mary Poppins¹ e esgueirou-se para ver se o lance do guarda-chuva realmente funcionava. Claro que, uma vez lá em cima, a certeza já não era tanta e ele ficou cheio de medo. Por pouco não caiu cá abaixo. Pensando bem, fiquei muito mais aliviado dessa vez. Não há nada no mundo que ultrapasse a segurança do meu irmão mais novo. Mesmo quando ele acha que não me conhece mais.

– E quanto ao outro aluno?

– Oficialmente, não lhe posso dizer nada sobre esse assunto. Mas posso sim te dizer que, se eu fosse você, não me admiraria se não o visse mais nessa escola – sorri de canto. Não é que eu quisesse mal ao garoto, mas queria sim que ele pagasse pelo que me tinha feito. Consciente ou inconscientemente – Pode regressar às suas aulas agora, Senhor Farro.

Assenti, ainda sorrindo, e me levantei, dirigindo-me para a porta.

– Ah, e Josh – me voltei ao som da mesma voz autoritária, mas ao mesmo tempo, reconfortante –, também lhe posso dizer que você perdeu os amigos errados.

Minha sobrancelha se franziu de imediato e fiquei fitando aquele homem, procurando uma resposta – qualquer resposta – a todas as perguntas que sua afirmação tinha lançado na minha mente. Mas ele apenas me olhou significativamente durante pouquíssimos segundos, para logo retomar sua expressão serena e distante.

– Pode ir, Senhor Farro, já falei.

Obedeci mecanicamente, sem nem me despedir, e, mal fechei a porta, me encostei nela, tentando absorver aquele olhar. Como assim, perdi os amigos errados? Eu não tinha culpa nisso, eu não tinha escolhido quais amigos perder! Ou será que tinha?

Não. Eles é que não tinham confiado em mim. Mesmo depois de três anos e tanta coisa que tivemos de enfrentar juntos, eles não tinham confiado em mim! Tinham me excluído de tudo o que eu mais gostava: da música, da banda, de nossa própria amizade… Como eles tiveram coragem para fazer isso?!

E foi ali, com as costas apoiadas na porta mais importante de toda a escola e com lágrimas diferentes das quais eu tinha engolido durante o último quarto de hora rolando livremente, que eu entendi que não tinha ficado tudo bem. Meus amigos mais fiéis não tinham confiado em mim e, depois daquela frase, daquele olhar da única pessoa que me protegeu no meio de tudo isso, já nem nos piores amigos – se lhes podia chamar amigos – eu podia confiar.

Não, não tinha ficado tudo bem. Se quer saber, acho que preferiria ter sido expulso. Talvez me sentisse menos sozinho numa escola onde não conhecesse ninguém.

I thought
(Eu pensei)
That we'd make it

(Que duraríamos)
Because you said

(Porque você disse)
That we'd make it through

(Que conseguiríamos ultrapassar)

And when

(E quando)
All security fails

(Toda a segurança falhar)
Will you be there

(Você estará lá)
To help me through?

(Para me ajudar a ultrapassar?)

¹ Um musical/filme norte-americano sobre uma ama linda demais que faz magia e que voa com seu guarda-chuva. Aqui tem uma imagem: http://www.emmines.co.uk/blog/wp-content/uploads/2012/04/mary-poppins-1964-06-g.jpg.

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