Capítulo 25

The shame that burns inside



Quinta-feira, 18 de Fevereiro
Sarah

Antes de qualquer coisa, vou deixar minhas imensas desculpas se essa entrada não parecer tão entusiasta como o normal; porém saiba que não é porque estou menos feliz –até pelo contrário – mas sim porque hoje foi um longo dia e estou esgotada. Mesmo assim, hoje aconteceu algo tão bom, que me obriga a ignorar o sono natural de alguém que passou sua noite fazendo os trabalhos de casa e que lhe escreve já perto da meia-noite.

Acabei por não escrever nada na noite da terça passada: estava muito cansada, depois de um dia de escola, gravações e duas conversas difíceis – sim, duas, porque, além da que tive com Taylor e que relatei aqui à hora do almoço, ainda falamos no final do dia com todo o nosso grupo. Mas o cansaço que essa última conversa possa ter causado não é de longe concorrência para o bem que fez – sobretudo porque todos concordamos que devíamos um pedido de desculpas a Josh. E quem sabe, talvez este tenha sido o primeiro passo para uma reconciliação.

Os últimos dois dias passaram correndo, entre mais escola, mais experiências incríveis no estúdio e, além de tudo isto, planos e ideias sobre como começar a conversa com Josh. Sendo o assunto tão delicado para todos, acho que é necessário que pensemos em tudo, desde o momento certo para falar, a abordagem ao assunto, e outros pormenores que possam fazer com que nossas expectativas saiam arruinadas.

Mas estou mais do que feliz em poder dizer que hoje achamos uma forma que talvez seja melhor que qualquer conversa – a única coisa no mundo que sabe falar melhor que as próprias palavras e que, só por acaso, nós temos bastante gosto em fazer: a música.

Foi ideia de Hayley, mas a culpa, por assim dizer, foi de Travis, que nos pediu para tocar Emergency hoje. Isso é algo realmente enigmático, porque nós estamos gravando Pressure (que será o nosso single de apresentação, já agora, fique feliz comigo), mas Travis apenas chegou no estúdio dizendo que estava num humorzinho chato e que, antes de se animar e fazer headbanging ao som de Pressure, gostaria de escutar Emergency. Como a cara dele estava longe de ser das melhores – exibindo até umas olheiras fundas que nunca antes vi nele – nós acedemos de imediato e lá nos enfiamos todos dentro da salinha de gravações (o que tem sido raro ultimamente, pois temos gravado a música por instrumento).

O resultado foi uma Emergency tocada emotivamente – como Emergency deve ser tocada sempre –, um Travis quase chorando do lado de lá do vidro, e uma Hayley realmente chorando do lado de cá. Quando lhe perguntamos o que estava acontecendo, ela olhou para nós com os olhos brilhantes e com um pequeno sorriso – que só serviu para nos confundir mais – e falou:

– Esse é o nosso pedido de desculpas.

Depois de pensar um pouco na música e no que ela significava, entreolhamo-nos com um sorriso que nem o de Hayley e cada um descarrilou para os seus próprios pensamentos, imaginando toda a cena.

– O que tá havendo aí, gente? – inquiriu Travis pelo alto-falante, despertando-nos do momento.

Saímos para a sala de mistura – onde ele estava – e sentamo-nos nos vários assentos espalhados pelo cômodo. Travis nos olhava com uma curiosidade que iluminava um pouco seu olhar cansado e baço.

– Sabe aquele problema que te falamos com o nosso antigo guitarrista? – Hayley começou, sorrindo mais largamente do que antes. O produtor assentiu, não conseguindo evitar corresponder com outro sorriso. –Emergency ajudar-nos-á a resolver as coisas.


POV Jeremy

Estar feliz durante uma aula de Matemática é algo que uma pessoa raramente experimenta. Mesmo assim, feliz é a palavra certa para descrever meu estado de espírito – tão feliz que nenhuma equação do mundo poderia me desanimar. E você só pode concordar comigo em como isso é ser muito feliz.

A razão é nada mais nada menos do que Josh, se é que isso faz algum sentido.

É que, ultimamente, ele tem sido uma razão de tristeza, raiva ou simples desânimo – e se você me conhece, eu não sou alguém com um caráter muito tolerante a sentimentos do tipo.

Porém, o que descobri na terça, com uma ajuda de Taylor e Sarah, é que talvez a razão não fosse exatamente Josh, mas sim o que nós fizemos em relação a ele – ou o que deixamos por fazer. E a leveza que senti depois de admitir que falhei apenas confirmou que isso era verdade.

Outra questão que influencia bastante tudo isso é que meu caráter também não é do estilo de se dar bem com impotência: se é preciso fazer algo, eu faço; se é preciso andar, eu ando; e se é preciso dar um empurrãozinho a alguém, eu dou. Como é que diz a professora de português mesmo? Prati—não. Pragma… Pragma-tis-mo. É isso, pragmatismo. Foi difícil achar isso um elogio na altura, porque né, mas depois de procurar o significado no dicionário, me senti bem orgulhoso.

Por outro lado, ser assim é complicado. Enfrentando qualquer situação, a pergunta que eu sempre coloco é: “o que eu posso fazer?”. E quando a resposta é “nada”… bem, você pode imaginar o quão perdido eu me sinto. Simplesmente ficar quieto é pedir demasiado da minha pessoa energética, porém é possível – só que vem em troca da maior parte da minha boa disposição.

Juntando tudo isso, acho que dá para entender o porquê de eu andar tão em baixo no último mês – e explica também porque me sinto tão feliz hoje. Para além de ter descoberto, finalmente, que há algo que eu posso fazer em relação a todo esse drama, ontem (quinta-feira) foi um dia que trouxe bastantes avanços para o caso. E o que eu mais quero nesse momento é fazer tudo o que eu possa e, quem sabe, ver as coisas se resolverem. Só de pensar nisso, sinto a energia a formigar por todo o meu corpo de novo!

E aqui estou eu, sonhando acordado, em plena aula de Matemática, com um pedido de desculpas a Josh que está praticamente decidido e preparado, e que me causa um pequeno sorriso que não consigo esconder – isto, até uma funcionária bater na porta da sala, e entrar, carregando um papel que logo se dedica a ler em voz alta:

– Comunicação oficial: devem comparecer no gabinete do diretor, no intervalo seguinte, os alunos Jeremy Davis e Hayley Williams.

****

– Bom dia, Sr. Diretor – falei, entrando em primeiro lugar no gabinete. Atrás de mim, vinham Jane, Hayley, Taylor e Sarah: a Paramore atual.

– Bom dia, meus caros alunos. Sentem-se, sentem-se – ele nos incitou, apontando para as cinco cadeiras já dispostas diante da sua secretária. – E então, como estão vocês nesta bela manhã?

Olhei confuso para Jane e notei que Hayley, Taylor e Sarah faziam o mesmo. Ser chamado ao gabinete do diretor não costuma ser algo que qualifique uma manhã como bela.

– Confusos. Não nos vai repreender, suspender, expulsar…? – Jane bateu no meu braço disfarçadamente, enquanto o diretor me olhava com um sorriso.

– Porquê, Sr. Davis? Você merece alguma dessas coisas?

– Não, não! Não, senhor!

O diretor riu e balançou a cabeça.

– Certo. Desculpem se estou assustando a vocês, mas podem todos respirar de alívio, que não é nada de mau. Só fico triste por ver que a minha companhia é tão repulsiva para vocês…

Eu olhei meio confuso, meio assustado para o diretor. Sério que ele estava brincando conosco?!

– Não escute o Jeremy, Sr. Diretor – falou Jane, mais carinhosa que o normal, e logo me mandando um olhar para eu ficar calado –, não é incomodo nenhum vir aqui.

– Porquê, Jane, você já está habituada? – brinquei, feliz por claramente lhe desobedecer. Essa é outra coisa sobre mim: eu adoro picar as pessoas. Especialmente se elas se chamarem Jane Streep.

– Por acaso, Sr. Davis, é a primeira vez que a Srta. Streep entra nesse gabinete, mas já você…

– Pois é, tem razão – cortei a fala do diretor, com ar arrependido. – Tentarei ser mais compreensivo para com a minha colega no futuro.

Ele revirou os olhos, mas Hayley não lhe deu muito espaço para meditar no que fazer em relação à minha insolência.

– Sr. Diretor, por favor ignore aqueles dois e nos diga o que viemos fazer aqui.

– A Srta Williams vai direta ao ponto, aprecio bastante isso – felizmente, minha insolência não era tanta que me permitisse perguntar-lhe porque não ia ele também direto ao ponto, se achava isso tão agradável. – Mas bem, acho que realmente chega de rodear o assunto. Eu estava apenas brincando com vocês para que a notícia não caísse tão… em seco. Enfim, meus amigos, o que lhes tenho a dizer é que finalmente terminamos as investigações sobre o graffiti que lhes diz respeito.

Acho que se pôde literalmente ouvir o ar a ser sugado para os nossos pulmões.

– E qual é a conclusão? – incitou Sarah, falando pouco acima de um sussurro.

– Joshua Farro, o suspeito inicial… Ele não esteve envolvido no incidente.

Tal como antes, o som da nossa expiração sobressaiu na sala silenciosa. Não sei se foi desse ar viciado ser libertado para o ambiente da sala, ou se foi da vergonha queimando meu interior, mas de repente me senti abafado. Muito abafado.

– Quem foi? – a pergunta de Taylor jamais teria sido audível se toda a sala não estivesse tão silenciosa. Acho que nos atingir com uma parede de cimento teria causado uma reação mais agradável.

– Tyler Vince, do 1ºJ.

– A turma do Zac – Taylor concluiu, mais para si mesmo, e passou as mãos por toda a cara. Sarah apertou seu ombro.

– Sim. Mas é importante notar que o Sr. Vince estava sob coação de terceiros. Mesmo assim, tendo sido ele o responsável pela ação em si, resolvemos providenciar uma transferência de escola. O incidente não ficará no seu registro, mas, por várias razões, consideramos melhor que ele mude de ares, por assim dizer.

– E esses terceiros, quem são eles? – perguntei eu, nem tirando o tempo para perceber do quão incrível era eu ter conseguido achar minha voz. Se bem que a culpa disso poderia ser da raiva. Ah, eu não precisava que o diretor me dissesse quem eles eram. Tudo o que eu queria era uma confirmação – uma confirmação que serviria de razão para eu quebrar suas caras da próxima vez que os visse.

– Sr. Davis, essas pessoas já receberam seu devido castigo e eu não pretendo revelar seus nomes.

– Mas o de Tyler você revela à primeira? Que hipocrisia é essa? – senti a mão de Jane apertando meu braço com veemência, mas eu sabia que tinha razão nesse ponto.

– Tyler está claramente envolvido no assunto. Já a contribuição dessas duas pessoas não pode ser medida com certeza, compreende, Jeremy? E além disso – ele acrescentou, falando menos autoritariamente e de forma mais compreensiva –, eu sei que vocês não têm qualquer problema anterior com Tyler.

Apenas duas outras palavras seriam mais claras que essas: Jenna e Chad.

A raiva impelia meu corpo para a frente e minha mente para novas perguntas.

– Como eles foram castigados?

– Jerem—

– Como é que eles foram castigados, por favor? – a autoridade encarou a minha insistência com uma expressão séria que, noutras circunstâncias, provavelmente me assustaria.

– Duvido que sequer terminem o ensino médio. Se isso o faz feliz, ótimo para você, porque a mim apenas mostra que falhei.

Essas palavras fortes acalmaram a minha raiva e me devolveram ao mesmo silêncio triste de antes. Desta vez, porém, ocupei minha cabeça, tentando tirar algum sentido de tudo isso. O diretor me acusava de me alegrar perante o castigo daqueles dois idiotas? Não, isso não me fazia feliz. Me fazia antes desejar ainda mais que eles tivessem pensado duas vezes antes de fazer a merda que fizeram.

Mas, acima de tudo, me fazia desejar que tivéssemos acreditado em Josh. E a culpa disso eu não podia colocar neles.

– Então, vocês vão ficar aí sentados se lamentando, ou vão fazer alguma coisa para remediar a situação?

Não precisei de olhar em volta para saber que todos reagiram de forma surpresa às palavras algo duras daquele homem que tinha feito mais para a resolução do problema na última semana, que nós desde que ele surgira. Assim como, depois do choque inicial passar e uma única certeza surgir na minha mente, não precisei de pedir a opinião deles para falar:

– Pode nos disponibilizar o auditório na próxima hora?

– Porquê? – questionou o diretor, de sobrancelha franzida e sem entender.

Mas antes que eu pudesse sequer cogitar uma resposta que explicasse o que pretendíamos fazer, a voz segura de Hayley soou por toda a sala.

– Porque esse pedido de desculpas vai acontecer hoje.

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